26 março 2009

O povo

No “Elogio da Loucura” Erasmo de Rotterdam põe na boca de sua personagem aquilo que ele pensava de seu tempo, dos sacerdotes e da igreja, dos teólogos, filósofos e governantes. Você não acredita que está lendo um livro escrito há 500 anos. Na verdade ele esculhamba a todo mundo, inclusive ao povo, a quem chama de grande e estúpida besta. No início do século XX, nos anos tenebrosos do entre guerras, Céline, um escritor que seria considerado mais tarde maldito, pelas suas escolhas ideológicas, referia-se ao povo francês como corja de fodidos, catarrentos, pulguentos, espezinhados etc, e na Argentina dos anos setenta, Ernesto Sabato, num artigo, diz que entre o povo e a beleza se abriu um grande fosso, fala em vulgaridade e coisificação, e que o povo de hoje não é essa fresca e virginal fonte de toda a sabedoria e de toda a beleza que imaginam certos estetas do populismo.

É comum ouvir dos sociólogos de plantão que a coisa degringolou, que um processo desencadeado pelos meios de comunicação, a mídia, tem como objetivo tornar burro o povo. A gente escuta isso toda hora, já foi tema de uma banda de rock. Parece que todos estão certos de que o povo é vítima de inimigos poderosíssimos e secretos que se escondem por trás de fachadas de grandes conglomerados, multinacionais etc. O Capitalismo é também outro vilão, nele, dizem, o povo assume o papel de consumista e para facilitar as coisas, tem de se enquadrar num mesmo padrão de exigência, o da mediocridade. É por isso que os livros, incluídos na lista dos mais vendidos da Veja, não constitui esforço intelectual nem mesmo para um equus asinus.

Será que é isso mesmo, ou tudo não passa de uma outra versão da história secreta dos protocolos, uma farsa?

Às vezes me parece que o povo nunca foi melhor do que hoje. Que nunca existiu isso de áureos tempos. Não para o povo. O povo nunca teve melhor educação nem foi menos alienado. Lembra do imperador romano que dava pão e circo ao povo? Fazia isso e governava numa boa. Talvez um dia, quem sabe, o povo deixe realmente de ser o que sempre foi; esta grande e estúpida besta como dizia Erasmo de Rotterdam.

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