09 julho 2009

Festival de Literatura

Este ano Garanhuns vai realizar sua 4ª edição do festival de literatura. Parece que começaram as conversas e muito ainda está por ser definido. Uma coisa ao menos é dita como certa: quem encabeça o movimento é a Academia de Letras e a prefeitura entra como parceira, fornecendo alguma estrutura.

Nas edições anteriores alguns equívocos do festival praticamente se repetiram. O maior deles é a formalidade. Não há um mediador. Alguém que conheça a obra do escritor e que seja capaz de provocar uma discussão. Ao invés disso a organização do festival teima em compor uma mesa com relator e presidente. Essas duas figuras não têm nenhuma serventia senão o de conferir ao momento certo ar solene, típico das reuniões acadêmicas. São escolhidos aleatoriamente – não demonstram conhecimento nenhum sobre o escritor em questão – e suas falas sempre são carregadas de agradecimentos e outras tolices inúteis. Todas as mesas são iniciadas por um solene mestre de cerimônias que não poupa os ouvidos da gente anunciando as autoridades da província: prefeito, vereador, secretário disso, secretário daquilo, além do chefe de polícia, o chefe dos bombeiros e por aí vai.

A maioria dos escritores, talvez influenciados pela formalidade, retira dos bolsos um calhamaço de papel ofício A4 e como se fosse a coisa mais natural do mundo, se põe a ler para uma platéia que agoniza. Os aplausos entusiastas são o alívio da agonia que chegou ao fim depois de 30 ou 40 minutos. Parece que ninguém teve ainda a idéia de simplesmente provocar uma conversa interessante e descontraída com o escritor. Isso acontece na festa literária de Parati onde as mesas duram em média duas horas. No ano passado, em Garanhuns, as mesas não passavam de trinta minutos e mesmo assim nos davam a impressão de um estágio no purgatório. Outra coisa absurda foi a falta de intervalo entre as mesas. Enquanto uma se desfaz, o mestre de cerimônia convoca os integrantes da próxima. Há urgência e correria, todos fitam seus relógios – faltam muitas mesas –, e aquilo que deveria seguir um ritmo capaz de conquistar a atenção e participação do público, transforma-se em pura necessidade de cumprir um horário que não pode sob hipótese nenhuma esticar. O resultado disso são pessoas insatisfeitas, a quem foi negado o direito de conversar sem parecer mal educadas, trocar idéias, tomar alguma bebida, comprar um livro ou simplesmente sair para respirar o clima da cidade.

Ano passado houve uma inovação interessante, algumas mesas deixaram o palco do teatro e foram realizadas numa tenda. O problema é que colocaram no mesmo ambiente feira de artesanato, sebo e livrarias. O resultado foi o mais bem sucedido projeto de reviver a Torre de Babel.

O festival tem vivido um paradoxo: deve sua realização ao interesse das Academias de Letras e é justamente por isso que não tem funcionado. Ouvi dizer que estão pensando em setembro como data do evento. Não sei se é verdade, mas se for e a formalidade continuar a mesma, pelo menos o mês é propício à pompa e ao desfile.

9 comentários:

Anônimo disse...

Você é muito critíco, e muito esnobe também. Seja menos idealista e procure explorar mais sua sabedoria.Um pouco de humildade não faz mal pra ninguém.

Helder Herik disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Helder Herik disse...

Faço minhas as suas palavras Nivaldo. Bela reflexão. Uma verdade. Espanta-me o comentário acima. Qual o mundo que prega uma pessoa que pede a outra para ser ‘menos idealista’? Na certa o autor do comentário deve ser partidário do Hugo Chavez ou pior ainda, deve ser partidário do Kim Jong-il, que herdou o poder norte coreano de seu pai e foi criado em um ambiente muito fechado. Sabemos também que o seu entendimento de mundo é muito particular, ele tem pouco contato com pessoas reais, de fora de seu próprio país e de seu poder estabelecido (ou seja, a famosa panelinha literária talvez de ‘Veneza ou da Suíça’), e uma visão de mundo limitada (não indo além de tapinhas nas costas e elogios inócuos-fúteis-reles-chinfrins-fuleiros)

O comentário pede para o Blogueiro explorar mais a sua sabedoria. Sem duvida que é um belo conselho (palmas)Mas incorre numa infeliz contradição. Quando prega a este que se conforme, sendo pouco idealista. Mais é assim mesmo, os idealistas são muito chatos, bom mesmo é ficar caladinho, comendo o pão que o diabo amassou.

Bem, acho de grande covardia, entrar em blog alheio, mesmo que tenha sido convidado, e fazer um comentário sem deixar seu nome, e-mail ou link de retorno. Tem todo o direito a criticar, (crescemos na critica, não é mesmo?) o que não pode haver é uma critica sem nome e sem rosto. Assim: desfigurada.

Na certa deve ser um homem bomba.

Seja humilde caro ‘comentarista’, aceite a critica de alguem que se mostra e está aberto ao diálogo. Suponho que o blogueiro Nivaldo deva está. Isto é uma crítica e não uma censura...

Tomei o partido do blogueiro porque comungo de suas ideias. Assim como outros podem discordar. E é assim que se constrói uma nação: com homens, livros e críticas. Ora pois.

Giovani Iemini disse...

deveriam existir festivais de literatura organizados pelo BAR DO ESCRITOR não só por ACADEMIAS de escritores....

Erika disse...

Parabéns pelo blog. O comentário deu o que falar.
Um abraço...

CERTEZZA disse...

As academias e suas burocracias. Engraçado que elas imitam a ‘francesa’, mas lá não existe esse formalismo. Existe organização, que é outra coisa. A FLIP é um modelo ideal de festa de livros.

Abraço

Mário Rodrigues disse...

Nivaldo, sua reflexão foi justa e sensata. O que acontece é que existem formas paradoxais de ser ver (e viver) a literatura. No caso analisado, há uma intenção, não fruto de um equívoco, de parecer solene e, sim, maçante também. Há uma ânsia de se mostrar mais importante do que se é, de se colocar em pedestais. Essas besteiras todas. Tal visão anacrônica apenas afugenta leitores, atuais e prospectivos, da “arte que cheira a mofo”. Enquanto, na verdade, a literatura continua sendo a arte mais democrática, não necessariamente popular, que existe.

Obs.: Estive fora uns dias, por isso não fui ao Café. Valeu.

Ivaldo disse...

Foi muito infeliz o primeiro comentário do artigo acima. Pessoas como essas pretendem que o Festival de Literatura em nossa cidade continue cada vez mais infeliz, que continue servindo apenas para certos acadêmicos desvilar e se esnobar falando de algo que eles menos entendem: literatura.

Literatura é algo que infelizmente poucas pessoas são dadas, seja para escrever ou para apenas apreciar a sua arte em si; se temos a oportunidade de ter um festival, que esse festival venha também para fazer as pessoas se aproximarem dela. Quando se trata desse festival em Garanhuns, é algo que parece surtir o efeito contrário, ou seja, fazem as pessoas se distanciar cada vez mais, isso ocorre, principalmente, pelo grau de formalidade em que ele ( o festival) nos é passado.


Temos esperança que isso um dia mude e que possamos desfrutar de um festival literário que busque a divulgação e o gosto pela Literatura e que esses valores não continuem sendo invertidos.

Anônimo disse...

Meu mestre, você como sempre se supera em sua forma ácida de ver a vida, porém com muita picardia. Concordo com tudo que disse e como faço parte da grande maioria que tem na literatura apenas mais uma forma de lazer e não uma forma de viver, gostaria que estes encontros literarios fossem menos formais. Ribeiro