13 outubro 2010

queixumes do carrasco

Louise Brouwn nasceu em 1978, foi o primeiro bebê proveta, depois nasceram muitos, fala-se em milhares. Este ano o Nobel de Medicina foi entregue a um dos responsáveis pela fertilização in vitro, o britânico Robert Edwards, de 85 anos. O Vaticano não gostou e quem nos deu a notícia de desagrado foi Ignácio Carrasco de Paula, presidente da Pontifícia Academia para a vida do Vaticano. Monsenhor Carrasco é porta-voz do Papa para assuntos relacionados à bioética, e disse que ficou perplexo com a escolha – que ele julgou fora de tempo – do novo laureado, lamentando o fato do prêmio ignorar as questões éticas levantadas pelo tratamento de fertilidade.

Monsenhor Carrasco diz que ficou perplexo.

Perplexo é como fica alguém quando sente uma forte indignação. Perplexos deveriam ficar todos os católicos – principalmente eles – com o anacronismo de uma Igreja que não se deu conta que a Idade Média ficou pra trás, quando seus representantes mais ilustres preconizavam que questionar a vontade de um soberano era o mesmo que questionar a Deus. Perplexos com uma Igreja e sua insistência em ser sempre o lado na discussão que não tem razão. A história mais clássica é a querela com Galileu, mas houve outras, antes e depois e em todas elas, a representante de Deus perdeu feio. É claro que naquela época o que ela não possuía em argumentos, esbanjava em poder, tanto é que outros opositores, também famosos, como Giordano Bruno, viraram churrasquinho. Mas esse tempo passou. Ninguém agora é queimado e a Igreja, com sua postura anacrônica apenas contribui para deixar ainda mais constrangido o próprio católico, coitado, que já tem de fazer verdadeiros malabarismos mentais – que Nietzsche chamava improbidade intelectual – e buscar na vida dos santos exemplos de cristandade já que muitos sacerdotes não servem de modelo (acho que nunca serviram) e estão envolvidos até o pescoço com a Justiça e o pagamento de indenizações a vítimas de abuso sexual. Mas o Estado é laico, Monsenhor Carrasco pode dizer o que quiser.

Estamos todos tranquilos, o carrasco não vai levar ninguém ao patíbulo, no máximo vai encontrar alguns simpáticos à sua causa, mas a maioria vai rir, achar engraçado e no final ninguém vai dar a menor atenção ao que o porta voz do vaticano tem a dizer sobre fertilização, manipulação genética, células-tronco embrionárias, clonagem ou uso contraceptivo da camisinha.

E tudo isso porque no Estado Laico – uma de nossas maiores conquistas – o carrasco não tem vez. Há severas sanções proibitivas sobre o uso indevido de abrir alçapões ou lidar com mecanismos de guilhotina. Também caçaram o porte do machado e lhe arrancaram o capuz da cabeça, é por isso que o encontramos nesse estado: fazendo muchocho e beicinho.

Um comentário:

Joaquim Rafael disse...

A igreja proibia a “violação” de cadáveres até outro dia (em termos históricos), para fins de pesquisas acadêmicas. Vá a medicina se render à proibição e ainda estaríamos nas sangrias com sanguessugas aplicadas por cirurgiões barbeiros