29 setembro 2010

no campo de centeio

Se nO Médico e o Monstro Stevenson trata da esquizofrenia quando se refere ao Dr Henry Jekyll e sua personalidade bipartida, Salinger, no seu O Apanhador no Campo de Centeio, trata do stress quando nos apresenta Holden Caulfield, um adolescente sob forte pressão, em sua jornada de volta para casa, depois de ter sido “chutado” da escola, o Internato Pencey, onde seu desinteresse pelo estudo resultou na conseqüente reprovação em quatro matérias.

É dezembro, faz um frio desgraçado, mas ele vai se despedir do professor, o velho Spencer que está gripado. Nesse capítulo, o segundo, o que se vê é um professor que tenta justificar para si mesmo – principalmente para si mesmo – que teve de reprovar o aluno porque não havia outro jeito, que o aluno fez por merecer, que o desinteresse dele pela matéria não podia resultar diferente. Lendo o capítulo de novo, notei que tanto interesse em justificar a nota vermelha só podia ser sinal de que alguma coisa estava errada.

O velho professor não está feliz, muito pelo contrário, aquela nota o incomodou e ainda incomoda, mas não há nada que possa fazer, é refém do sistema (década de 50). Não importa que Holden seja inteligente e criativo, não importa seu ótimo desempenho em inglês tampouco que mais tarde venha a escrever um livro considerado o porta voz de uma geração, o fato é que ele, Holden, foi reprovado em quatro das cinco matérias parciais.

O livro conta a história de um adolescente expulso da escola e que volta pra casa e no caminho sofre a expectativa de enfrentar os pais. Um garoto aloprado e sua viagem, uma odisséia em que o viajante é dispensado de provar seu valor. Não há nenhum valor. A coragem, grandeza ou nobreza são adjetivos que não lhe pertence. Ele não é um cavaleiro, nem Dom Quixote, sequer a paródia de um herói, apenas um adolescente amargurado porque não cumpriu sua parte no jogo. É verdade que ele não escolheu jogar, que aquele jogo não lhe interessava, que considerava uma chateação suas regras. Mas é preciso jogar, todo mundo tem de jogar, é o único meio de provar seu valor, de ser aceito pela sociedade que seus mestres e pais se orgulham em pertencer. Ele é introspectivo e suas digressões denunciam a superficialidade da vida na classe média americana: seres esvaziados de significado.

Mas nada disso importa, não importa sua capacidade de interpretar uma geração, sua sensibilidade em detectar a futilidade dos americanos, novos ricos e entusiastas do que o dinheiro poderia comprar; o consumo desenfreado e a banalidade. O fato é que foi reprovado nas provas, precisa ser expulso, procurar seu lugar entre os fracassados.

O professor sofre, no íntimo sabe que o sistema comete uma injustiça em sufocar o menino, em avaliar seu talento tomando como base apenas seu desempenho em matérias escolares. Holden vai sofrer um esgotamento e vai parar numa clínica onde escreve o livro, sua válvula de escape. Outros, antes e depois dele, serão mais radicais: vão atirar nos colegas ou cometer suicídio.

O assassino de John Lennon estava com O Apanhador no Campo de Centeio quando cometeu o crime, disse que a leitura do romance “forneceria a explicação de sua relação ambígua com o ídolo.”

2 comentários:

Helder Herik disse...

Nivaldo, caso queira assistir ao filme que retrata o jovem, o romance e o assassinato do John Lennon, é só falar que eu tenho. O filme se chama 'Capitulo 27'

Abração.

Negro Sangue disse...

O desejo já estava lá, era necessário aoenas algo que o justificasse.

Erick Camilo