Uma
professora que se rendeu à cultura do fácil, inspirada, talvez, na comida fast
food, reescreve e torna fácil o Machado, substituindo sinônimos, pasteurizando
etc só por causa das reclamações de seus alunos que consideram todo clássico um
saco. Lógico que isso é absurdo, em literatura pouco importa o que se diz, mas
como diz e nisso a atitude da professora se mostra equivocada. Essa questão
para mim e para quase todo mundo com quem conversei parece muito fácil de
resolver, a sorte dela é que não mais existem fogueiras da inquisição para
queimar os possuídos do diabo – no caso da professora, os despossuídos da
razão. Eu amo Machado de Assis por suas
soluções, aprecio seu narrador escorregadio, aprecio nele o precursor de
Borges. Machado de Assis não precisa de sinônimos que atualizem sua linguagem.
Ele é o fundador da modernidade. Nessa história, todo mundo já sabe, existem
dois vilões, a professora e sua equipe de prestidigitadores e o Ministério da
Cultura que apoiou a causa. Nenhuma novidade, portanto. Uma coisa, entretanto,
chamou-me a atenção. Tem gente – e gente da melhor espécie – que pensa que o
importante mesmo é que o jovem leia, não importa o quê. Todos os livros, não
importam de que anão ou fada estamos falando. O importante é ler. Como se ler
garantisse a salvação. Jesus não salva, ler o evangelho sim. Acho isso uma
histeria. Quem disse que todo mundo precisa ler? Quem disse que para o outro –
um outro que imagino agora – a experiência de ler é tão importante como foi para
mim, por exemplo e para muitos, como para você que está lendo este texto? Vamos
reservar ao outro o direito de também não ler. No evento Clisertão, ouvindo a
história do Rogério Pereira sobre sua experiência de leitor a gente nota que
ele teve todos os motivos do mundo – e a história dele não é diferente da
minha, talvez pouco diferente da sua, leitor amigo – para não ler, desde pais
analfabetos a péssimas condições de vida quando o que importava era a
sobrevivência, isso, entretanto, não o impediu de ser leitor. É claro que
devemos fazer a nossa parte, é preciso investir na educação, pagar e preparar
professores, devemos ler para nossos filhos, comprar livros etc, mas nada de
histeria, nada de querer adaptar Machado de Assis ou outro clássico para a linguagem
de hoje. Quem não gostou do Machado original tampouco vai gostar na versão fast
food.